quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Lo-Li-Ta

“E eu não conseguia parar de olhar para ela, e soube tão claramente como sei agora, que estou prestes a morrer, que a amava mais que tudo que já vi ou imaginei na Terra, ou esperei descobrir em qualquer outro lugar.”
(NABOKOV, Vladimir. Lolita. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011, p. 323).

"O fato é que eu a amava. Tinha sido amor à primeira vista, à última vista, às vistas de todo o sempre."
(NABOKOV, Vladimir. Lolita. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011, p. 314).

Escolhi esses trechos tão doces para desmistificar um pouco o livro Lolita. À primeira lida na sinopse, a obra prima do Nabokov pode parecer um livro completamente asqueroso por narrar a história de um homem quarentão que se apaixona loucamente por sua enteada de 12 anos. Mas Lolita é muito mais que um livro sobre pedofilia.


Um dos livros mais bem escritos que tive oportunidade de ler na vida, Lolita é narrado em primeira pessoa pelo próprio Humbert Humbert e no contexto da história é uma obra póstuma que foi escrita enquanto o narrador-personagem estava na prisão e publicada somente depois que ele morreu por lá. (ATENÇÃO: Estou falando sobre o personagem fictício e não sobre o escritor Vladimir Nabokov).

O narrador nos fala sobre sua infância e sua paixão aos 13 anos por uma garota, que o marcou por toda a vida. Após um casamento mal sucedido, o professor Humbert Humbert muda-se para os Estados Unidos e lá chegou a ser internado em um sanatório. Ao ser considerado “curado”, ele vai morar numa cidade do interior e é aí que ele conhece e se apaixona por Dolores Haze, que ele chama de Lolita.

Para manter-se perto da sua pequena paixão, ele decide casar-se com a mãe dela; devido a alguns acontecimentos, ele e a menina partem numa viagem pelos Estados Unidos.

Basicamente é essa a história de Lolita e nós seguimos ávidos na leitura para descobrir porque o Humbert Humbert terminou os seus dias preso e o que aconteceu com a sua ninfeta.

Para falar desse livro, eu preciso organizar as ideias para conseguir transmitir tudo que eu senti com esse livro, que com certeza superou minhas expectativas.

A primeira coisa que preciso dizer é que Humbert Humbert não é um pedófilo qualquer, ele só se sente atraído por ninfetas, um tipo de meninas com um charme diferente e que exercem um grande poder sobre ele, embora não se deem conta disso. A ruína de Lolita foi perceber o quanto ela podia manipular o Humbert, o poder que ela tinha sobre ele.

Durante o livro, o personagem aborda com delicadeza e profundidade, a sua obsessão por ninfetas, o fascínio delas ou das suas estranhezas para estar perto delas. Entretanto, o narrador convence que faz tudo isso de uma forma recatada, ele devora as ninfetas apenas à distância.

Ao conhecer Dolores Haze, a quem ele chama de Lolita (eu já citei isso, né?), ele se vê perdidamente apaixonado pela menina. E com a convivência – narrada por ele – surge a possibilidade de ter sido Lolita a grande culpada de tudo, como se ela o provocasse e seduzisse.

O tempo todo os pensamentos do Humbert são asquerosos e pedófilos, mas, apesar de ter passado um tempo internado, ele não é tão perigoso, porque ele aprecia as ninfetas de longe. E ele tenta convencer o leitor que foi uma vítima de Lolita, mas é preciso ressaltar que é ele quem está contando a história. Como narrador, o Humbert nos transmite a sua visão, certamente distorcida pela paixão. É ele quem nos conta das tentações da menina.

Consigo ver aqui culpa e inocência na menina. É verdade que em determinados momentos ela o provoca com frases e atitudes, mas ela é somente uma menina entrando na puberdade. E tudo que ela faz é ingenuidade dela e também pela noção de controle que ela tem sobre o Humbert. Eu vi a Lolita como se ela estivesse apenas brincando. E, depois, quando as coisas ficam sérias demais e o humor dela muda, quando ela começa a chorar, ficar agressiva, é porque ela está se dando conta da infância e liberdade perdidas.

Muita gente diz que o livro é nojento e que é preciso ter muita frieza para ler Lolita, mas eu acho que não. Durante uma parte do livro, toda a “sujeira” está apenas nos pensamentos do Humbert. E depois ele passa implicitamente pelo sexo. É tudo contado de forma “superficial” ou metafórica, não é um livro pornô. Lolita não tem nenhum palavrão.

Além de mostrar um grande domínio de linguagem e escrita, Nabokov domina o assunto abordado. Humbert é um personagem muito bem construído, ele é perfeito. Eu não entendo nada sobre pessoas loucas, mas a forma que ele narra a história mostra que ele é doente; seus pensamentos sempre tão concentrados nas ninfetas e na sua sua sua Lolita apresentam claramente o nível de sua obsessão e sua constante tentativa de diminuir sua culpa, de se colocar como vítima é, para mim, uma característica perturbada, manipuladora, doentia que é movida pela paixão.

Mas, gente, que final é aquele? Depois de todo o asco, a repugnância. Eu não consegui odiar o Humbert Humbert porque o fim me pareceu um redenção. É muito tocante, é romântico, é delicioso. No todo, Lolita é um livro convincente e uma leitura muito agradável!

|| Informações:
Lolita do original Lolita
Escrito por Vladimir Nabokov e traduzido por Sergio Flaksman; Posfácio de Martin Amis
Publicado pela editora Alfaguara
391 páginas

7 comentários:

  1. Ótima resenha Mi, já li este livro, mas não consigo me lembrar das sensações que senti ao ler.

    Assim que eu por minhas leituras em dia, com certeza vou procurar pelo Lolita, nem me lembro mais do final :O

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  2. Achei que a sua resenha ficou muito boa, de verdade. Já ouvi falar desse livro, mas nunca me interessei por ele, acho que não ia gostar da leitura.

    Beijokas :*

    Blog da Mylloka

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  3. Gente, que primor de resenha. Sério. Fiquei encantada.
    Definitivamente preciso ler Lolita, e acho que entrará nas minhas leituras do mês que vem.

    Espero conseguir ter a mesma visão que tu.

    liliescreve.blogspot.com

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  4. Ai, agora fiquei extremamente curiosa para ler esse livro. Já estava um pouco, agora demais. Caçando aqui, pra ler em breve.

    Thais Vianna
    2dathais

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  5. Mi querida sua resenha ficou fantástica fique mega curiosa para ler esse livro.
    Adoto sua visão dos livros clássicos, além do mais quem vai ler esse livro tem que ler com mente aberta e sem preconceitos não é????
    Estou lendo um livro que fala de pedofilia também Cilada do Harlan Coben, conhece????
    Bjos

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  6. Eu nunca tive vontade de ler, justamente pelo teor do livro. Pra mim não tem isso de vítima, um homem que se apaixona por uma menina/criança é o único culpado, e sim, pedófilo. Lógico que é fácil falar, já que não li o livro, mas não vejo como posso sentir pena, mesmo que ele pense mais do que faça, até porque é justamente como você disse, temos que levar em consideração que é ele quem está narrando e vai contar o lado dele, que claramente será um pouco aliviado/deturpado pelo seu ponto de vista. Talvez isso mude ao ler a história, não sei.
    De qualquer forma, não descarto a leitura no futuro, até porque fiquei curiosa para saber o que acontece e de que forma o personagem consegue encontrar a sua redenção. A construção do personagem parece ser impecável.
    A resenha ficou ótima, Mi!
    Beijos!

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  7. Fiquei super curiosa pra ler esse livro!!! Espero conseguir logo!!! Seria bom se tivesse a versão da Lolita da história.

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Obrigada!