A Batalha de Bombaim é a batalha do eu contra a multidão. Suketu Mehta.
Esta é a epígrafe do
capítulo seis do livro Cruzando o
caminho do sol e é com esta frase que quero começar a Leitura Crítica do
livro.
Já fazia um bom tempo que
não passava uma madrugada lendo e me senti feliz por ter feito isso com Cruzando o caminho do sol. Eis um livro
que desde a sinopse eu já sabia que se enquadrava no meu gosto literário e que
pareceu para mim uma anomalia no catálogo da Novo Conceito – mas não estou
dizendo que isso é ruim, é o contrário aliás.
Para quem está acostumado
com Nicholas Sparks e Emily Giffin, as palavras de Corban Addison podem não ser
muito agradáveis. E eu li várias resenhas para saber a opinião das pessoas a
respeito do livro, lamentei muito pelas resenhas superficiais, enfim, só posso dizer
que opinião é uma coisa muito pessoal. Mas não sejam tolos a ponto de ler um
relato destes e ignorar, se eu pudesse resumir em duas palavras todo o livro,
escolheria estas: pura realidade.
Ahalya e Sita são duas
adolescentes (17 e 15 anos respectivamente) que sobrevivem ao tsunami que destruiu
a costa leste da Índia e matou, dentre milhares de pessoas, seus familiares.
Sem ter para onde ir, elas encontram um homem que reconhecem como um amigo de
trabalho do pai e pedem ajuda a ele para chegar ao convento onde estudam,
entretanto, elas terminam chegando a um bordel em Mumbai.
Do outro lado do
Atlântico, está o advogado Thomas Clarke, que viu sua esposa partir – de volta
para a casa de sua família, em Mumbai – e está vendo sua carreira profissional
sofrer uns abalos. Seu chefe então lhe recomenda que ele tire um ano sabático e
ele escolhe ir para Mumbai trabalhar em uma ONG que tenta proteger meninas que
são vítimas do tráfico e exploração sexual.
Eu sei que isso foi, por
enquanto, só uma sinopse alternativa. Mas há muito mais para falar sobre Cruzando o caminho do sol.
O livro, escrito por um
advogado, mostra toda a corrupção do mundo. Mesmo tendo toda a escravidão do
mundo sido abolida, restou no submundo o sequestro da subjetividade, o
sequestro de vidas, liberdades, destinos, inocências, futuros.
Neste livro, o ponto de
partida da história é o tsunami, mas, em outros casos, meninas de países
subdesenvolvidos são enganadas sob a promessa de um emprego como babá ou
garçonete na América (EUA, mais precisamente) e na Europa e perdem suas vidas
nas mãos de cafetões, vendidas e estupradas em bordeis. Em alguns casos, elas
nem cruzam longas distâncias, saem de regiões costeiras e interioranas na
própria Índia e terminam em Mumbai.
Eu acho muito interessante
os sentimentos de amor e ódio que os nascidos em Mumbai nutrem pela cidade. O
ambiente é sujo, poluído, corrupto, pobre, mal conservado, e eles têm vergonha
disso, mas simplesmente amam. E, cada vez mais, constato que lar é muito mais
que um lugar para morar, o lar é a identidade de uma pessoa.
Após alguns dias em
Mumbai, Ahalya passa a ser estuprada por clientes do bordel, mas mantém-se
sólida para transmitir segurança para Sita, que ainda não foi tocada por
ninguém. Entretanto, quando o resgate vem, por intermédio da equipe que Thomas
é integrante, Sita desapareceu. É neste momento que os destinos de Ahalya e
Thomas se cruzam, ela confia a ele a missão de encontrar sua irmã e ele, sem
entender os motivos, toma para si esta responsabilidade.
O que senti na maior parte
do tempo, além de uma eletrizante e furiosa vontade de ler, foram asco e nojo
da espécie humana, racional. O que me prendeu nas páginas de Cruzando o caminho do sol não foi a
beleza ou o romantismo – quase inexistentes nesta obra – foi justamente o
contrário, o ódio, a raiva, o desprezo. As meninas são tratadas como
mercadorias, são objetos negociados. Senti uma imensa agonia, ao ver as
esperanças de Sita transformarem-se em desespero a cada noite fria, a cada
agressão, a cada tentativa de fuga. Senti que eu também amargurei com Ahalya,
por ter sido violentada, abusada e por não saber onde estava sua irmã. Me senti
incapaz, minúscula, inútil com Thomas ao perceber que o dinheiro está acima dos
valores morais, que quem tem grana não tem lei.
Outro ponto que gostaria
de ressaltar, é que o autor fala de tráfico sexual sem cenas de sexo, pois é,
em nenhum momento ele narra detalhes de como acontecem os estupros.
Paralelamente, Thomas, que
está afastado do trabalho, sente que precisa reconquistar sua esposa, Pryia, e
desta vez com a bênção do pai dela. Mas o relacionamento deles sempre foi um
pouco complicado por causa da diferença cultural (heterogeneidade representa o
caos) e a medida que o tempo foi passando, eles começaram a divergir; O ponto
extremo do relacionamento foi quando a filha recém nascida do casal amanheceu
sem vida.
O que nos encanta no
Thomas talvez seja simplesmente isso: ele é um homem com defeitos, que colocou
a vida profissional acima do lar; e está tentando corrigir os seus erros,
resolver seus próprios problemas, mas ele parte mundo afora com o intuito de
ajudar Ahalya e Sita.
Recomendo sem restrições.
E deixo a dica de leitura:
Sua resposta vale um bilhão, do
indiano Vikas Swarup.
|| Informações:
Cruzando o caminho do sol
Corban Addison
Novo Conceito
448 páginas
Super interessante sua opinião. Tinha lido umas resenhas sobre o livro, mas não me passaram muita informação. Já a sua, foi bem profunda e franca. Gostei muito!
ResponderExcluirPelo visto teremos um livro que retrata a realidade, afinal esse tipo de situação acontece diariamente. A resenha foi ótima, me deixou bem curiosa sobre o livro, sentindo um pedacinho dele.
ResponderExcluirBjs
www.daimaginacaoaescrita.com
Gostei bastante deste livro, acho muito legal quando os escritores decidem mostrar a realidade humana, ao invés de romances que nunca acontecem. Embora eu adore suspirar ao ler um livro, é bem mais satisfatório terminar a leitura de um livro tão real como este.
ResponderExcluirBeijos
Amigas entre Livros
Oi Milena!
ResponderExcluirRealmente é um livro que pode ser recomendado sem restrições. É lindo, emocionante e até mesmo angustiante. Adorei esse livro, virou até um favorito de tão envolvida que fiquei!
Beijos.
Gostei da sua opinião sobre o livro :)
ResponderExcluirMe convenceu a ler >.<
Beijos e cuide-se
www.rimasdopreto.com
Ah sempre tive vontade de ler o Sua resposta vale um bilhão, vou compra-lo qualquer dia desses.
ResponderExcluirMas o assunto agora é outro, vamos lá! Também estou intrigada com a história do Cruzando o Caminho do Sol. A história pelo visto é super triste, e tenho receio pois sou muito mole, mas não podemos simplesmente fechar os olhos para a realidade, a vida muitas vezes é cruel e tem muita gente que sofre muito.
Fico feliz porém, que o autor não relate detalhes de uma cena que seria muito forte ao meu ver.
Muito boa a resenha, só tenho escutado elogios sobre esse livro!
Beijão!
Com certeza todo mundo que fizer resenha desse livro vai soltar spoiller, não tem como.
ResponderExcluirÉ um livro intenso, o temo é muito polemico e não tem como não ficar nervosa.
Parabéns pela resenha
Beijo
Bruna-Livros de Cabeceira
Adorei a resenha. Agora estou morrendo de curiosidade quanto ao livro.
ResponderExcluirParabéns pelo blog.
http://aestantedeleitorescompulsivos.blogspot.com.br/
Amei essa capa, e quanto ao spoiller,as vezes não tem como mesmo ficar sem fazer, nem que seja um pouquinho kkkkk
ResponderExcluirparabens pela resenha
De todas as resenhas que já li sobre esse livro, acho que essa foi a mais completa! Fiquei com muita vontade de ler esse livro agora, acho a capa linda!
ResponderExcluirÓtima resenha!
Eu também gostei muitíssimo desse livro, achei que o autor achou o tom certo para lidar com um tema tão forte e difícil, ele faz um relato bem direto e sem rodeios, evitando cair no melodrama; apesar da narrativa quase jornalística todo o sofrimento das irmãs pode ser sentido e realmente eu não queria parar de ler apesar de tudo.
ResponderExcluirEsse estilo de livro não é tão divulgado entre os jovens. Parece-me ser um abrir de olhos para o que acontece em lugares que não estamos acostumados a ver.
ResponderExcluirOi! Tudo bem?! Resenhas pequenas talvez tragam um conteúdo mais especulativo que resenhas enormes. Mas acima de tudo resenhas são opiniões pessoais e não cabe a mim julgar. Gostei muito do livro! Me fez parar para pensar na realidade e acima de tudo torcer pelos personagens! Fiz uma resenha lá no meu blog, se tiver interesse ou mera curiosidade, dê uma passadinha por lá! Vou logo avisando que minha resenha é pequena, haha!
ResponderExcluirBjs, Ruama.
http://esquiloscorderosa-ruama.blogspot.com.br/
Hey! Tudo bem?! Então, não quis dizer que sua resenha seja especulativa de forma nenhuma. É porque você comentou de resenhas curtas, eu quis só dizer que talvez as resenhas curtas apresentem um maior teor de exploração do conteúdo, foi isso que quis dizer com a palavra especulativa. Por favor não me entenda mal. Me desculpa se em algum momento eu te ofendi, essa jamais foi a minha intenção. Espero ter me expressado de forma melhor.
ResponderExcluirBjs, Ruama.
http://esquiloscorderosa-ruama.blogspot.com.br/